Portaria nº 776, de 28 de abril de 2004
Dispõe sobre a regulamentação dos procedimentos relativos à vigilância da saúde dos trabalhadores expostos ao benzeno, e dá outras providências
O MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE, no uso de suas atribuições, e
Considerando o arcabouço jurídico legal que fundamenta as ações de Saúde do Trabalhador no País, conforme o disposto nos arts. 198 e 200 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, combinado com os preceitos da Lei Orgânica da Saúde – Lei nº 8080/90 e da Portaria nº 3.120/GM, de 1º de julho de 1998, que dispõe sobre a Instrução Normativa de Vigilância em Saúde do Trabalhador;
Considerando o determinado no Acordo Benzeno, assinado em 1995, Capítulo III – Das Competências, nos subitens 4.1.3 e 5.3, que prevêem responsabilidades para o Ministério da Saúde e para o Ministério do Trabalho e Emprego, com relação à Vigilância da Saúde dos Trabalhadores na Prevenção da Exposição Ocupacional ao Benzeno;
Considerando a necessidade de articular, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, ações de prevenção, promoção e recuperação da saúde dos trabalhadores urbanos e rurais independentemente do vínculo empregatício e do tipo de inserção no mercado de trabalho;
Considerando a necessidade de garantir a atenção em saúde do trabalhador no SUS, incluindo ações de assistência, vigilância e promoção;
Considerando que o acompanhamento epidemiológico sistemático das populações expostas a agentes químicos é uma das formas de controle sanitário que permite a detecção de casos de agravos à saúde precocemente; e
Considerando que o benzeno é um agente mielotóxico regular, leucemogênico e cancerígeno, mesmo em baixas concentrações, resolve:
Art. 1º Instituir, na forma do Anexo desta Portaria, as Normas de Vigilância à Saúde dos Trabalhadores expostos ao Benzeno nos processos de trabalho que produzem, utilizam, transportam, armazenam ou manipulam benzeno e, ou suas misturas líquidas.
Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
HUMBERTO COSTA
Ministro da Saúde
ANEXO
NORMAS DE VIGILÂNCIA À SAÚDE DOS TRABALHADORES EXPOSTOS AO BENZENO
1 – OBJETIVO
Regulamentar os procedimentos relativos à vigilância da saúde dos trabalhadores expostos ao benzeno.
2 – CAMPO DE APLICAÇÃO
As empresas e respectivas contratadas que produzem, utilizam, transportam, armazenam e manipulam benzeno ou
suas misturas líquidas para os serviços de saúde públicos e privados, laboratórios e outras instâncias institucionais do campo da saúde do trabalhador.
3 – CONCEITOS
Vigilância Epidemiológica – Entende-se por vigilância epidemiológica um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes da saúde
individual e coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos (Lei nº 8.080/90).
Vigilância Sanitária – Entende-se por vigilância sanitária um conjunto de ações capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde (Lei nº 8.080/90).
Vigilância em Saúde do Trabalhador – Entende-se por vigilância em saúde do trabalhador uma atuação contínua e sistemática, ao longo do tempo, no sentido de detectar, conhecer, pesquisar e analisar os fatores determinantes e condicionantes dos agravos à saúde relacionados aos processos e ambientes de trabalho, em seus aspectos tecnológico, social e organizacional e epidemiológico, com a finalidade de planejar, executar e avaliar intervenções sobre esses aspectos, de forma a eliminá-los ou controlá-los (Instrução Normativa de Vigilância em Saúde do Trabalhador no SUS – Portaria nº 3.120/GM, de 1º de julho de 1998).
Benzeno – É um hidrocarboneto aromático que se apresenta como um líquido incolor, lipossolúvel, volátil, inflamável, de odor característico, perceptível a concentrações da ordem de 12 ppm, cuja fórmula molecular é C6H6. Registro CAS n.71-43-2, registro ONU n.1114.
Benzenismo – Conjunto de sinais, sintomas e complicações decorrentes da exposição aguda ou crônica ao hidrocarboneto aromático, benzeno. As complicações podem ser agudas, quando houver exposição a altas concentrações com presença de sinais e sintomas neurológicos, ou crônicas, com sinais e sintomas clínicos diversos,
podendo ocorrer complicações a médio ou a longo prazo, localizadas principalmente no sistema hematopoético.
4- DIRETRIZES
4.1- Diagnóstico da Intoxicação Ocupacional pelo Benzeno
4.1.1 – Introdução: O benzeno é um mielotóxico regular, leucemogênico e cancerígeno, mesmo em baixas concentrações. Outras alterações podem também ocorrer como descrito a seguir. Não existem sinais ou sintomas patognomônicos da intoxicação.
4.1.2 – Síndrome Clínica da Intoxicação pelo Benzeno: Quadro Clínico e Laboratorial da Toxicidade pelo Benzeno: Considera-se toxicidade do benzeno (ou benzenismo) quando a pessoa apresenta um conjunto de sinais e sintomas e que tenha sido exposta ao benzeno. O quadro clínico de toxicidade ao benzeno caracteriza-se por uma repercussão
orgânica múltipla, em que o comprometimento da medula óssea é o componente mais freqüente e significativo, sendo a causa básica de diversas alterações hematológicas.
Os sinais e sintomas ocorrem em aproximadamente 60% dos casos. São eles: astenia, mialgia, sonolência, tontura e sinais infecciosos de repetição. Os dados laboratoriais hematológicos mais relevantes são representados pelo aparecimento de neutropenia, leucopenia, eosinofilia, linfocitopenia, monocitopenia, macrocitose, pontilhado basófilo, pseudo Pelger e plaquetopenia.
O diagnóstico de benzenismo, de natureza ocupacional, é eminentemente clínico e epidemiológico, fundamentando-se na história de exposição ocupacional e na observação de sintomas e sinais clínicos e laboratoriais descritos anteriormente.
Entende-se como exposição ocupacional a exposição acima de níveis populacionais, decorrente de atividades laborais .
Em pessoas potencialmente expostas ao benzeno, todas as alterações hematológicas devem ser valorizadas, investigadas e justificadas.
A toxicidade do benzeno pode ser aguda ou crônica. Em cada um desses casos há sinais e sintomas clínicos que descreveremos a seguir:
Efeitos Agudos: O benzeno é um irritante moderado das mucosas e sua aspiração em altas concentrações pode provocar edema pulmonar. Os vapores são, também, irritantes para as mucosas oculares e respiratórias.
A absorção do benzeno provoca efeitos tóxicos para o sistema nervoso central, causando, de acordo com a quantidade ab-sorvida, narcose e excitação seguida de sonolência, tonturas, cefaléia, náuseas, taquicardia, dificuldade respiratória, tremores, convulsões, perda da consciência e morte.
Efeitos Crônicos: Principais Agravos À Saúde Alterações Hematológicas: Vários tipos de alterações sangüíneas, isoladas ou associadas, estão relacionadas à exposição ao benzeno. Em virtude da lesão do tecido da medula óssea (local de produção de células sangüíneas), essas alterações correspondem, sobretudo, a hipoplasia, displasia e aplasia.
O aparecimento de macrocitose, pontilhado basófilo, hiposegmentação dos neutrófilos (pseudo Pelger), eosinofilia, linfocito-penia e macroplaquetas são alterações precocemente apreciadas na toxicidade benzênica.
A hipoplasia da medula óssea pode ocasionar, no sangue periférico, citopenia(s). A leucopenia com neutropenia corresponde à principal repercussão hematológica da hipoplasia secundária ao benzeno e, em menor freqüência, à plaquetopenia isolada ou associada à neutropenia. Estudos realizados em medula óssea de trabalhadores com benzenismo evidenciaram a relação entre a neutropenia periférica e a hipoplasia granulocítica, numa mediana de quatro anos de exposição. Estudo posterior, realizado com a mesma coorte de pacientes, após o afastamento da exposição, demonstrou um tempo médio de 5 anos para a recuperação hematológica periférica.
A aplasia da medula óssea, que corresponde à depressão de todas as linhagens hematológicas, expressa-se no sangue
periférico através de pancitopenia (leucopenia, plaquetopenia e anemia).
O caráter leucemogênico do benzeno é amplamente reconhecido.
As transformações leucêmicas, precedidas ou não por alterações mielodisplásicas, são objeto de diversas publicações, sendo a leucemia mielóide aguda, entre todas, a mais freqüente. Outras variantes são também descritas.
Além de leucemogênica, a toxicidade por benzeno está também relacionada ao surgimento de outras formas de doenças onco-hematológicas, como linfoma não-Hodgkin, mieloma múltiplo e mie-lofibrose, embora em menor freqüência.
Alterações Neuro-Psicológicas e Neurológicas: São observadas alterações como: atenção, percepção, memória, habilidade motora, viso-espacial, viso-construtiva, função executiva, raciocínio lógico, linguagem, aprendizagem e humor.
Além dessas disfunções cognitivas, surgem outras alterações como: astenia, cefaléia, depressão, insônia, agitação e alterações de comportamento.
São também descritos quadros de polineuropatias periféricas e mielites transversas.
No sistema auditivo podem aparecer alterações periféricas como centrais, podendo ser observadas: perdas auditivas
neurossensoriais, zumbidos, vertigens e dificuldades no processamento auditivo.
Outras Alterações: Foram observadas alterações cromossômicas numéricas e estruturais em linfócitos e células da medula óssea de trabalhadores expostos ao benzeno. É possível fazer avaliação de danos cromossomiais através de técnicas citogenéticas.
Podem ocorrer alterações dermatológicas tais como eritema e dermatite irritativa de contato por exposições ocupacionais repetidas e prolongadas ao benzeno.
Outras formas de câncer podem ser observadas devido a associação da exposição do benzeno com gás de coqueria e
de vazamentos em indústrias que manipulam correntes de naftas ou produtos petroquímicos.
4.1.3 – Parâmetros Clínico-Laboratoriais
Parâmetros Clínicos: Durante a condução diagnóstica dos casos suspeitos de leucopenia secundária à toxicidade benzênica, alguns fatores devem ser considerados: as enfermidades ou as situações clínicas e fisiológicas que cursam com leucopenia, como, por exemplo, colagenoses, viroses, alcoolismo, exposição a medicamentos e a outros agentes mielotóxicos devem ser investigadas. As neutropenias constitucionais e as situações anteriormente descritas devem ser objeto de análise sistemática, sem, contudo, permitir que sua comprovação seja suficiente para afastar a hipótese de associação com a toxicidade benzênica, (veja principais causas de leucopenias no QUADRO I).
Quadro I
Por outro lado, uma série histórica evidenciando valores leucocitários baixos e constantes, na ausência de exames pré-admissionais, não deve ser suficiente para afastar neutropenia secundária ao benzenismo; o caso deve, portanto, permanecer em investigação.
Uma criteriosa análise do quadro clínico é insubstituível.
Para se ter uma visão panorâmica, não se deve considerar apenas os resultados de exames, devendo ser valorizada também, a história ocupacional.
Hemograma: O hemograma é um dos principais instrumentos laboratoriais para detecção de alterações tardias da hematopoese em casos de toxicidade crônica por benzeno.
Deve ser realizado pelo método automático com hemocitoscopia criteriosa. Deve-se salientar que a coleta deve ser realizada, na ausência de jejum.
Os valores referenciais para fins de análise devem ser os do próprio indivíduo em período prévio à exposição a qualquer agente mielotóxico. Do ponto de vista prático, caso seja desconhecido, admite-se como supostamente anormal toda leucopenia que, após ampla investigação, nenhuma causa reativa possa ser apontada que a justifique.
Os resultados de hemogramas devem ser organizados na forma de série histórica de forma a permitir a comparação sistemática e permanente dos dados e análise de alterações eventuais ou persistentes.
Deve-se salientar que todos os trabalhadores expostos ao benzeno, portadores de leucopenia isolada ou associada à outra alteração hematológica, são, a princípio, suspeitos de serem portadores de lesão da medula óssea mediada pelo benzeno. A partir desse ponto de vista, na ausência de outra causa, a leucopenia deve ser atribuída à toxicidade por essa substância.
Outros Exames: A análise clínica dos casos suspeitos deve nortear os passos seguintes até a conclusão destes. Pode ser necessária a realização de uma grande variedade de exames, como punção aspirativa e, ou biópsia de medula óssea, estudos citogenéticos, entre outros que ficam a critério de especialista.
4.1.4 – Protocolo de Investigação de Casos Suspeitos:
O protocolo de investigação de dano em expostos ao benzeno deve conter as seguintes informações e procedimentos:
a) História Clínica Atual e Pregressa, incluindo a investigação de exposição a agentes mielotóxicos (medicamentos, radiação ionizante, entre outros), interrogatório dos diversos aparelhos, antecedentes pessoais e familiares e exame físico completo;
b) História Ocupacional Atual (antecedentes profissionais) com informação sobre as empresas, setores, funções, tarefas e respectivos períodos de trabalho;
c) Levantamento dos Dados Hematológicos de que dispõe o trabalhador, inclusive os anteriores à admissão na empresa suspeita de causadora da toxicidade;
d) Exames Complementares:
– Hemograma com análise quantitativa e qualitativa das três séries sangüíneas e contagem de reticulócitos. Na ausência da série histórica, realizar três hemogramas com intervalo de 15 dias.
– Transaminases (AST e ALT), gama glutamil transferase, bilirrubinas totais e frações e LDH.
– Provas de atividades reumáticas ou inflamatórias: VHS, Proteína C reativa e FAN.
– Marcadores de Hepatite B e C (anti-HBS Ag, anti-HBc – IgM e anti-HCV).
– Anti-HIV.
e) Estudo da Medula Óssea (Biópsia de medula óssea e mielograma) – sempre que indicados clinicamente;
f) Outros Exames – poderão ser solicitados, de acordo com o exame clínico; e
g) Outras Investigações:
– Avaliação Sobre o Sistema Nervoso Central – Avaliação de queixas neuropsicológicas e neuropsiquiátricas, efeitos
ototóxicos e alterações citogenéticas deverão ser realizados sempre que necessário.
– Avaliação Neuropsicológica / Neurocomportamental, É um instrumento para investigação dos efeitos que à exposição a substâncias neurotóxicas produz sobre os processos psíquicos no homem. Objetiva estabelecer a presença ou não de disfunção cognitiva e distúrbios afetivos e localizar alterações sutis, a fim de detectar as disfunções ainda em estágios iniciais.
– O benzeno, como os solventes, pode causar distúrbios de memória de curto prazo, raciocínio e resoluções de problemas, execução de tarefas visoconstrutivas ou verbais e habilidade de planejar.
– A avaliação das alterações neuropsicológicas é feita por meio de bateria de testes específicos, padronizados e de entrevista clínica.
– Avaliação Neurológica – Para investigar os efeitos da exposição ao benzeno, bem como a solventes orgânicos no sistema auditivo, o uso de exames convencionais como a audiometria tonal por via aérea e óssea e a audiometria vocal podem não ser suficientes.
– O emprego de outros testes audiológicos como imitanciometria, exame vestibular, otoemissão acústica, audiometria de tronco cerebral e provas de processamento auditivo são importantes para complementar informações sobre o topodiagnóstico da lesão.
4.1.5 – Conclusão Diagnóstica:
O diagnóstico diferencial da intoxicação crônica pelo benzeno deverá ser conduzido pelo médico clínico responsável de acordo com o que lhe parecer adequado.
Do Caso Para Ser Investigado:
Critérios Para Iniciar a Investigação do Caso de Toxicidade Crônica do Benzeno – Alterações Hematológicas:
Para o reconhecimento de casos que serão investigados, deverão ser evidenciadas as seguintes situações em indivíduos expostos ocupacionalmente ao benzeno.
Embora estejam explícitos somente os critérios de alteração nos valores da contagem de leucócitos totais, todas as alterações hematológicas, consideradas relevantes, devem ser valorizadas e investigadas.
Constatação de alterações hematológicas – Instalação de leucopenia.
Para análise da leucometria, recomenda-se:
4.1.5.1 – Para Trabalhadores sem História de Exposição: A média de 3 hemogramas realizados com intervalo de 15
dias, sendo o primeiro realizado no processo de admissão no emprego.
Esse será o parâmetro de comparação para verificação da instalação de leucopenia.
4.1.5.2 – Para Trabalhadores Antigos:
– O exame admissional anterior à exposição a agentes mielotóxicos servirá como referência.
– Caso não se localize o exame referido no item anterior, deve-se utilizar a média da contagem de leucócitos dos
hemogramas anteriores à instalação da tendência decrescente.
– Quando, em juízo profissional, não for possível usar os dois critérios acima, adotar os valores de referência de Williams 2001, valores fixos populacionais contidos na Tabela 1 do anexo 1A destas Normas.
Devem ser alvo de investigação os trabalhadores que apresentarem:
(1) QUEDA RELEVANTE E PERSISTENTE DA
LEUCOMETRIA, constatada através de 3 (três) exames com intervalo de 15 (quinze) dias, com ou sem outras alterações associadas.
Um índice arbitrário de 20% de redução da leucometria poderá ser usado para considerar queda significativa em relação aos critérios anteriores. Essa taxa poderá ser reavaliada, baseada em novos estudos. Variações menores e a
presença de outras alterações hematológicas devem ser consideradas, quando suspeitada sua relevância.
Observação: na análise de séries históricas consolidadas com grandes períodos de acompanhamento, deve ser considerado o patamar pré-exposição ou o mais próximo possível desse período.
(2) PRESENÇA DE ALTERAÇÕES HEMATOLÓGICAS EM HEMOGRAMAS SERIADOS, sem outros achados clínicos que as justifiquem, como:
– AUMENTO DO VOLUME CORPUSCULAR MÉDIO (macrocitose), diminuição do número absoluto de linfócitos (linfopenia ou linfocitopenia);
– LEUCOCITOSE PERSISTENTE;
– ALTERAÇÕES NEUTROFÍLICAS: Pontilhado basófilo, hipossegmentação dos neutrófilos (pseudo Pelger) ;
– PRESENÇA DE MACROPLAQUETAS;
– LEUCOPENIA COM ASSOCIAÇÃO DE OUTRAS CITOPENIAS (plaquetopenia).
DO CASO CONSIDERADO SUSPEITO
Considera-se CASO SUSPEITO de toxidade crônica por benzeno a presença de alteração hematológica relevante e sustentada.
A relevância foi definida nos critérios anteriores e a sustentabilidade considerada mínima é definida após a realização de 3 hemogramas com intervalos de 15 dias entre eles. Nas situações em que persistem as alterações nesse
tempo mínimo de 45 dias, considera-se o CASO SUSPEITO.
Deve ser iniciada investigação segundo item protocolo de investigação de caso suspeito destas Normas.
DO CASO CONFIRMADO DE TOXICIDADE CRÔNICA DO BENZENO
Ao se realizar a avaliação clínico-laboratorial do caso suspeito e confirmada a ausência de enfermidades concomitantes que possam acarretar tais alterações além da exposição ao benzeno, fica estabelecido o diagnóstico de benzenismo.
4.2 – Tratamento de Intoxicação Ocupacional pelo Benzeno
Não existe tratamento medicamentoso específico para os casos de intoxicação pelo benzeno.
O acompanhamento médico para os casos confirmados de intoxicação deve ser regular e em longo prazo. As intercorrências clínicas devem ser tratadas com precocidade.
As perturbações de ordem psíquica e social causadas aos indivíduos devem merecer atenção especializada em programas de saúde integrados sob o enfoque do trabalho.
4.3 – Prognóstico de Intoxicação Ocupacional pelo Benzeno
4.3.1 – Os trabalhadores que apresentaram alterações hematológicas devido à exposição ao benzeno devem ser considerados suscetíveis ou hipersensibilizados, sendo maior o risco de agravamento do quadro, em especial o desenvolvimento de neoplasias.
4.3.2 – É possível a reversão do quadro hematológico periférico que pode ocorrer após um período longo do afastamento do risco. Porém, a reversão para a “normalidade” do quadro hematimétrico, no sangue periférico, não deve ser considerada como estado de cura.
Todas as pessoas expostas e que manifestaram alterações hematológicas devem ter acompanhamento médico, devendo seu posto de trabalho e sua atividades serem analisados, no sentido de serem afastadas da exposição ocupacional ao benzeno, utilizando-se para tal o anexo 2 como critério. Tal procedimento deve ser assegurado pela empresa e aprovado pelo órgão competente da fiscalização do ambiente de trabalho (MTE/DRT e SUS).
4.3.3 – A reversão das alterações periféricas para níveis hematimétricos normais não exclui a possibilidade de evolução para o agravamento, como a manifestação de hemopatias malignas ou anemia aplástica tardia.
4.3.4 – Mesmo após a remissão das alterações hematológicas periféricas ou de outras manifestações clínicas, os casos
deverão ser acompanhados clínica e laboratorialmente de forma permanente, com periodicidade pelo menos anual, através da realização de exames complementares propostos em um protocolo de acompanhamento pelo órgão de referência do SUS.
4.3.5 – A normalização ou estabilidade dos valores hematimétricos do sangue periférico, após afastamento do ambiente de trabalho, não descaracteriza a intoxicação e nem constitui critério para retorno a um ambiente ou função com risco de exposição.
4.4 – Consequências do Afastamento
4.4.1 – Alterações Psicossociais: A condição de incapaz, ainda que temporária ou circunstancial, para o trabalho, pode acarretar sérios transtornos psicossociais a esses indivíduos, entre os quais destacamos:
– Perda da Identidade Psicossocial: o indivíduo perde a sua referência social, ao deixar de ocupar o lugar que lhe era
socialmente conferido, o que acarreta a conseqüente perda da identidade psíquica. O indivíduo não sabe mais quem é, nem que lugar ocupa.
– Estigmatização: o indivíduo se sente marcado – cabe lembrar que a palavra estigma é sinônimo de ferrete, instrumento que era usado para marcar os escravos – pela sua condição de não trabalhador. Essas alterações psicossociais características dos trabalha-dores, configuram um quadro psicopatológico peculiar do afastamento, onde uma alteração orgânica – por exemplo, uma leucopenia, propicia o desenvolvimento de outra, de ordem psíquica, ou seja, a necessidade de afastamento desses trabalhadores de áreas contaminadas pelo benzeno, somada à especificidade da qualificação da maioria desses trabalhadores, o que os impossibilita de trabalharem em outra atividade econômica, faz com que, mesmo afastados, ou mais precisamente em virtude desse afastamento, se produza um adoecimento de natureza psicossocial.
4.5 – Prevenção:
Considerando-se as características do produto como toxicidade e carcinogenicidade, as ações preventivas são as que se apresentam como sendo de maior relevância na proteção da saúde. Assim, o ambiente e o processo de trabalho devem assegurar sempre a menor exposição ocupacional possível.
Medidas de proteção coletiva adotadas no processo de trabalho, minimizando a exposição ou eliminando o agente, e
medidas de proteção individual contribuem decididamente na prevenção da intoxicação.
A avaliação quantitativa do nível de benzeno no ar, associada à avaliação individual da exposição e à análise do Índice Biológico de Exposição (IBE) em grupos homogêneos de risco de exposição, constituí ferramenta importante quando se objetiva a avaliação da ex-posição e a implantação de medidas de controle para diminuição e eliminação do risco (vide Instrução Normativa – IN-01 Acordo do Benzeno).
5. Procedimentos Operacionais
5.1. Procedimentos Administrativos: (Conforme o Acordo Nacional do Benzeno e normatizado na IN-02).
As empresas devem garantir ao trabalhador sob investigação de alteração do seu estado de saúde com suspeita de ser de etiologia ocupacional, os seguintes procedimentos:
– afastamento da exposição, de acordo com o anexo 2;
– emissão da CAT;
– encaminhamento ao INSS para avaliação previdenciária;
– encaminhamento ao SUS para investigação clínica e registro;
– custeio pleno de consultas, exames e pareceres necessários à elucidação diagnóstica de suspeita de danos à saúde
provocados por benzeno;
– custeio pleno de medicamentos, materiais médicos, internações hospitalares e procedimentos médicos de tratamento de dano à saúde provocado por benzeno ou suas seqüelas e conseqüências; e
– desencadear ações imediatas de correção, prevenção e controle no ambiente, condições e processos de trabalho.
5.2 – Procedimento Retorno:
Consideram-se como área de retorno os critérios apresentados no anexo 2 devem ser notificados imediatamente as
comissões regionais do Benzeno e, em caso da não existência dessas comissões, aos órgãos de vigilância da Saúde do
Trabalhador e ao DRT para verificação do local de retorno.
5.3 – Procedimentos de Informação:
O Ministério da Saúde, a partir dos dados de cadastro de empresas da CNPBz, deverá encaminhar aos respectivos
Estados a relação dessas empresas para fins de acompanhamento regional.
5.3.1 – Informações Decorrentes das Empresas:
Cabe aos serviços das empresas cadastradas no MTE encaminhar aos serviços de saúde do trabalhador de sua área
de abrangência, em meio magnético padronizado pelo SIMPEAQ, anualmente, no mês de março:
– Nome e registro de trabalhadores com data de nascimento, sexo, função, setor de atividade e empresa em que está prestando serviço no caso de terceiros, com ou sem sinais e sintomas de benzenismo, afastados ou não do trabalho,
incluindo os demitidos a contar de um período de 20 anos passados.
– A série histórica de hemogramas realizados em exames admissional, periódicos e demissional, anualmente, no mês
de março, em meio magnético padronizado pelo SIMPEAQ.
– Cópia dos resultados das alterações clínicas e dos exames de indicador biológico de exposição realizados em exames periódicos e demissional, bem como avaliações citoquímicas, imunológicas, citogenéticas, histológicas, neuropsicológicas e neuropsiquiátricas, realizadas em trabalhadores expostos ao benzeno, em meio magnético padronizado pelo SIMPEAQ.
– Dados de monitorização ambiental do benzeno (exposição individual e de área; média ponderada pelo tempo, curta
duração, instantâneas de emergência ou não) realizada nos diversos setores da empresa, a cada semestre.
– As informações de acidentes com vazamentos, em 24 horas, e o registro permanente de modificações operacionais e estruturais das plantas.
Observações:
– É de responsabilidade solidária de contratantes e contratadas o envio e a padronização das informações contidas nos itens 1 a 7.
– Os prontuários médicos dos trabalhadores e dos intoxicados devem ser mantidos à disposição daqueles, dos seus representantes legalmente constituídos e dos órgãos públicos por, no mínimo, 20 (vinte) anos após o desligamento do trabalhador.
5.3.2 – Informações Decorrentes de Outras Instâncias:
As instâncias e serviços que atuam na área de saúde do trabalhador deverão realizar a vigilância epidemiológica de morbi-mortalidade de casos de aplasia de medula e câncer do sistema hematopoético, ocorridos em maiores de 18 anos de idade. Esse sistema deve ser gerenciado pelos serviços de saúde do trabalhador responsáveis por cada região, que terão as seguintes atribuições:
– analisar dos os dados das companhias de seguros das empresas cadastradas no MTE relativas a estes dados;
– identificar regionalmente os serviços de hematologia e oncologia que notificarão, conforme ficha de notificação anexa, os ser-viços de saúde do trabalhador da região. Por sua vez, esses serviços de saúde do trabalhador deverão
investigar o nexo com a exposição ao benzeno em cada um desses casos;
– os dados confirmados de nexo com a exposição ao benzeno deverão ser comunicados pelos serviços de saúde via SINAN.
Os laboratórios de análises clínicas deverão notificar ao responsável pela vigilância em saúde do trabalhador de sua
área todos os resultados de indicadores biológicos de exposição do benzeno, anualmente, em meio magnético, conforme padronização pelo SIMPEAQ.
Todos os dados constantes do Sistema de Informação deverão ser analisados e compilados nos diversos níveis do sistema (região/Município, Estado, Ministério da Saúde) e gerenciados pelas comissões regionais de acompanhamento do acordo do benzeno. O Ministério da Saúde deverá fazer a publicação anual dos dados analisados e compilados a esse nível.
5.4. Procedimentos de Intervenção:
Os serviços de saúde do trabalhador realizarão a vigilância dos ambientes e processos de trabalho, compreendendo a
análise, a investigação, a orientação, a fiscalização e a aplicação de penalidades nas empresas, por meio de inspeções sanitárias.
A notificação, a intimação, a autuação, a multa, a suspensão de atividades e a interdição seguirão legislação da área de abrangência do serviço, de acordo com as legislações e portarias pertinentes, tais como Códigos Sanitários, Lei nº
8080/90 e Portaria nº 3120/GM, de 1º de julho de 1998.
Critérios para priorização da vigilância dos ambientes de trabalho:
– estatísticas geradas pelos Sistemas de Informação (SINAN, SIMPEAQ entre outros);
– o não-cumprimento de qualquer norma estabelecida para o benzeno;
– denúncia de trabalhadores, meios de comunicação ou sociedades civis;
– solicitação do sindicato de trabalhadores; e
– investigações sistemáticas.
Os serviços de saúde do trabalhador deverão privilegiar na intervenção nos ambientes de trabalho:
Análise das informações existentes (atas de CIPA, ROAS, PPEOB, PPRA, PCMSO, programas de saúde, ambiente e
segurança, informações de outras instituições).
Análise e observação das situações potenciais de risco.
Estabelecimento de proposta s de eliminação, controle e redução de risco.
Participação dos trabalhadores e seus representantes em todas as etapas da intervenção.
Processos de discussão, de negociação e de formalização de acordos envolvendo empregadores, governo, trabalhadores e sociedade civil para estabelecimento de medidas de eliminação, controle e redução da exposição ao benzeno além do previsto na legislação.
Ações de integração interinstitucionais com o Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério da Previdência Social, os Ministérios Públicos, as Secretarias de Meio Ambiente, e as Instituições de ensino e pesquisa, entre outras.
Os serviços de saúde do trabalhador deverão manter atualizado o cadastro das empresas de produção, utilização, manipulação, armazenamento ou transporte de benzeno na sua área de abrangência.
As instâncias estaduais do SUS deverão assessorar os serviços municipais e regionais de saúde do trabalhador nas
ações de vigilância dos ambiente s de trabalho e realizá-las em caráter complementar.
Deverão ser incentivadas a criação e as ações de instâncias regionais de acompanhamento do acordo nacional do benzeno.
O Ministério da Saúde estabelecerá estratégias de integração entre os pólos de vigilância visando o reforço da municipalização e à comunicação entre os níveis do sistema.
6 – ANEXOS
1A
1B
TABELA 3: DIFERENÇAS ÉTNICAS E DE HORÁRIO DE COLETA NO HEMOGRA, SEGUNDO WINTROBE – 10 A EDIÇÃO – 1999.
Nota: Os valores das tabelas 1, 2 e 3 demonstram que as variações são diferentes segundo a base populacional e as variabilidades decorrentes de métodos de coleta diversificados. Cabe destacar a necessidade de serem estabelecidos valores a partir da experiência brasileira e que estes deverão estar disponíveis assim que forem definidos.
ANEXO 2
CRITÉRIOS DE RETORNO DE TRABALHADORES AFASTADOS DO TRABALHO POR AGRAVOS À SAÚDE DECORRENTES DA EXPOSIÇÃO AO BENZENO
1 – Objetivo: Definir parâmetros para o retorno seguro de trabalhadores afastados por agravos à saúde decorrentes da exposição ao benzeno.
2 – Critérios: O local de trabalho deve ser avaliado quanto aos seguintes critérios:
– avaliação da exposição – qualitativa e quantitativa; e
– avaliação epidemiológica de agravos à saúde dos trabalhadores.
3 – Critérios de Avaliação da Exposição:
Qualitativa: O trabalhador em situação de retorno, independentemente da área ou setor para onde for lotado, não deve participar de atividades que representam risco de exposição acima de 0.1 ppm, tais como (lista exemplificativa):
Paradas, emergências, vazamentos;
Leitura de nível de tanque com trena (e temperatura);
Transferências e carregamento de produtos;
Comando de evasões;
Coletas de amostras de produtos, insumos, matérias-primas, etc., para fins de controle de qualidade de processo;
Limpeza de equipamentos;
Acompanhamento de serviços de manutenção ou de liberação de equipamentos;
Atividade envolvendo outros mielotóxicos; e
A empresa deve possuir procedimento escrito que garanta o cumprimento deste critério e deve orientar seus trabalhadores quanto a esse procedimento.
Quantitativa: O trabalhador somente poderá ser lotado em área ou setor onde esteja ocorrendo controle rigoroso das
concentrações de benzeno, de acordo com a IN-01.
Os resultados de avaliação da concentração de benzeno na área e na atividade não devem ultrapassar 0,1 ppmv MPT.
Para avaliação da conformidade com o valor de referência para retorno (0,1 ppm), serão considerados os resultados das concentrações obtidas no processo de avaliação realizado pela empresa, devendo ser submetidos à avaliação e validação das autoridades públicas competentes, TEM e/ou SUS, tanto o processo de coleta e análise quanto os valores obtidos.
4 – Critério de Avaliação Epidemiológica:
Realizar comparação das séries históricas de hemogramas de pelo menos 30 trabalhadores do setor/atividade escolhida para o retorno. Analisar a existência de casos de alterações hematológicas possivelmente relacionadas ao benzeno.
Quando o setor tiver menos que 30 trabalhadores, considerar a população total dos trabalhadores do setor e a sua história epidemiológica para agravos à saúde decorrentes da exposição ao benzeno. É recomendado que o (s) grupos (s) homogêneos (s) de referência para avaliação seja (m) constituído (s) por empregados com cinco anos ou mais na
atividade ou local de trabalho.
Na ocorrência de pelo menos um caso de diminuição persistente de, no mínimo, 20% da média dos parâmetros hematológicos considerados pela IN-02, sem justificativa clínica, deve ser caracterizada a existência de suspeitos de mielotoxidade ocupacional no grupo avaliado.
A presença de suspeitos de mielotoxicidade no setor ou atividade implica setor inadequado para o retorno do trabalhador.
Observações:
Caso o empregado tenha sido remanejado de área com exposição, o seu histórico deve ser avaliado à luz das atividades na nova área.
Na ausência de série histórica, recomenda-se a utilização dos seguintes parâmetros:
– realização do indicador biológico adotado pela empresa para avaliação de exposições a benzeno até 1 ppm (ácido
trans, trans – mucônico urinário, por exemplo) no (s) grupo(s) homogêneo (s) de referência;
– comparação do hemograma atual com o exame admissional; e
– na ausência de exame admissional deve ser considerado como referência o critério de Williams (IN-02) para avaliação.
Validação: O GTB deverá participar do processo de seleção das áreas/atividades para o retorno dos trabalhadores, observando o item 9.7.1 nos casos de discordância.
A liberação da área/atividade para retorno deverá ser realizada pelas autoridades competentes na área de saúde e
segurança.
ANEXO 3
Ficha de notificação de elevação do indicador biológico de exposição do benzeno acima da normalidade:
ANEXO 4
Siglas:
Anti-HBs Ag – marcador da Hepatite B
Anti-HBc -IgM – marcador da Hepatite B
BMO – Biópsia de Medula Óssea
CAS – Código Internacional de Substâncias Químicas
CAT – Comunicação de Acidente de Trabalho
CMV – Citomegalovirus
DRT – Delegacia Regional do Trabalho
FAN – Fator Anti-Nuclear
HIV – Virus da Síndrome de Imunodeficiência Adquirida
HCV – Vírus da Hepatite C
IBE – Indicador Biológico de Exposição
IgM – Imunoglobulina M
INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social
MO – Medula Óssea
MS – Ministério da Saúde
MTE – Ministério do Trabalho e Emprego
LES – Lupus Eritematoso Sistêmico
ONU – Organização das Nações Unidas
PCMSO – Plano de Controle Médico de Saúde Ocupacional
PPEOB – Plano de Prevenção da Exposição Ocupacional ao Benzeno
PPRA – Plano de Prevenção de Riscos Ambientais
SIMPEAQ – Sistema de Informações de Populações Expostas a Agentes Químicos
SUS – Sistema Único de Saúde
VHS – Velocidade de Hemossedimentação